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Jornal da Escola Secundária de Rocha Peixoto
Pesquisa

Clonagem: perspetiva inovadora ou imoral?
Por Sofia Brito (Aluna, 12ºG), em 2013/01/261184 leram | 1 comentários | 203 gostam
Depois de visualizar o documentário da National Geographic, "Clonagem", os alunos de Psicologia do 12º ano foram desafiados a tomar a sua própria posição em relação a este polémico ramo da ciência moderna. Esta é a minha opinião.
A visualização do documentário "Clonagem" da National Geographic não alterou a minha opinião inicial em relação à clonagem, mas permitiu-me, de facto, fundamentá-la de uma forma bastante mais aprofundada. A posição que tomo em relação à clonagem é, portanto, contrária aos avanços da ciência.

Comecemos pela abordagem menos complexa: a clonagem reprodutora com vista a preservar espécies em vias de extinção. Tudo parece ser correto e até bom e moralmente louvável, até que nos colocamos a questão fundamental: qual é a razão por trás dessa ameaça à espécie? Quando a resposta é o processo de seleção natural, surge a inconveniência da ação humana em processos naturais evolutivos, nos quais não interferimos até um passado extremamente recente e que, do meu ponto de vista, funcionavam com certeza melhor sem a nossa intervenção (nomeadamente, através dos alimentos transgénicos, entre outros). Não estamos a tentar submeter o mundo à nossa volta a um estilo de vida consumista – ou, mais provável ainda, a um mero capricho da nossa parte? Uma espécie em vias de extinção devido ao decurso de um processo de seleção natural não irá vingar ainda que a façamos “ressurgir”, a menos que a protejamos em nichos ecológicos artificiais – e até que ponto é isso louvável?
Por outro lado, quando a resposta à pergunta inicial é a própria ação humana, não parece um contra-senso que, primeiro, coloquemos em risco a preservação de uma espécie destruindo-lhe o habitat ou caçando-a com excessividade, para depois trazê-la de volta – ou para um nicho ecológico diferente ou artificial, ou para o mesmo ambiente de caça? Não estaremos a desenhar um ciclo vicioso que passará a ideia de que até a extinção é algo reparável? Não será mais correto defender o habitat natural da espécie e fazer ver a quem a ameaça o quanto está errado do que ensinar-lhe o exato oposto, passando a mensagem de que não importa o quão destruidoras sejam as nossas atitudes, que a ciência encontrará um modo de as reverter?

No caso da clonagem reprodutora, creio que esta é uma opção que deveria encontrar-se já descartada. É certo que temos os ditos “clones naturais”, os gémeos homozigóticos, que foram gerados com o mesmo património genético e, ainda assim, mantêm a sua identidade pessoal única. Mas não nos podemos esquecer que, neste caso, os irmãos encontram-se em pé de igualdade: ambos tiveram pai e mãe e são geneticamente relacionados com os dois. Não se levantam aqui as questões que se levantam na criação de clones humanos intencionais, como por exemplo: quem é, de facto, a mãe biológica de um bebé que é um clone do pai?, a relação entre o pai e o seu filho clone é de progenitor – cria?, e a relação entre a mãe e o bebé?, até que ponto não irá esperar o pai que o filho se comporte como aquele quando tinha a mesma idade?... A clonagem humana abre um mundo de consequências e possíveis disfuncionalidades que não conhecemos nem podemos prever, mas que, caso se torne uma realidade, serão questões com as quais teremos que lidar – talvez um pouco tarde demais.
Outra dessas questões prender-se-á com a origem da vida. Talvez a clonagem confira a um clone um objetivo de vida, uma resposta à célebre pergunta que atormenta a raça humana: “Por que estamos aqui?”. No caso de um clone, a resposta é com certeza mais clara – a sua origem encontra-se num processo premeditado, intencional, possivelmente demorado e custoso. Mas será que ter a resposta a tal pergunta equivalerá a uma melhor noção de si mesmo? Ou será apenas um condicionalismo para a sua vida, uma expectativa que o percurso vital que deveria ser somente seu terá de satisfazer? Até que ponto ter sido criado com um propósito específico fá-lo-á mais firme no seu desígnio, ou por outro lado, até onde significará uma menor liberdade?
Por outro ponto de vista, é de notar que a diferença entre o património genético dos diferentes seres humanos é de apenas 0,1%, face aos outros 99,9% que temos em comum (como desmascarou a descodificação do genoma humano). Podemos ver que a diferença entre nós – o que nos torna únicos, irrepetíveis e insubstituíveis – é já algo um pouco parco, certamente acentuado pelos nossos diferentes percursos de vida e pelo processo de individuação, mas geneticamente já condicionado. Com que propósito vamos nós tornar essa diferença ainda mais escassa? Para que servirá diminuir a variabilidade genética? Aliás, será isso sequer saudável ou desejável para nós enquanto espécie? Não será a diferença algo a defender e a proteger?
Quanto à manipulação genética, tantas vezes veiculada ao processo de clonagem reprodutora, considero-a simplesmente fútil e desnecessária, particularmente no que toca às características físicas. Como argumentava Zavos (com o qual tantas vezes discordei, mas que, por fim, defendeu um ponto de vista que com ele partilho) e ainda Annas, esta manipulação humana sobre os desígnios naturais pode muito bem estar na génese de um novo tipo de eugenia. Sabemos por experiência que só nos apercebemos do carácter erróneo e imoral das outras teses defensoras da eugenia quando o mal já tinha significado a morte ou escravatura de milhões. Neste caso, deparamo-nos de antemão com esta questão; será realmente sensato abrir a porta a esta possibilidade? Além disso, quem somos nós para decidir que uma vida deficiente é menos valiosa que as restantes? Quem somos nós para considerá-la indigna e, portanto indesejável? É certo que vemos a descartagem de embriões portadores de deficiências como uma ajuda aos mesmos, mas até que ponto é correto decidirmos por eles se eles têm ou não o direito à vida? Por a qualidade de vida ser inferior, não podemos assumir que a própria vida é inferior também.

Já no que toca à clonagem terapêutica, o debate neste caso prende-se com a questão do começo da vida humana. Na minha opinião, a vida humana começa assim que se dá a possibilidade da sua existência: a partir do momento em que há uma possibilidade concreta para a eventual criação de uma vida humana, o desenvolvimento dessa dita “possbilidade” – desse embrião – deve ser zelado, defendido e cuidado ao máximo. Esse embrião tem tanto direito à vida como terá um ser humano adulto, e não deixa de o ter apenas por não ter a capacidade mental do mesmo. Ter ou não um cérebro formado não me se me apresenta como uma condição ao direito à vida; a questão é bem mais clara do que isso: quando existe uma perspetiva de vida, essa vida tem o direito a existir. E não é correto privá-la desse direito, ainda que seja para melhorar a condição de um indíviduo já formado. Não é correto matar uma vida para salvar outra – sobretudo quando a criamos com esse único propósito. Um embrião jamais será apenas um aglomerado de células, e para provar isso basta dizer que foi por esse mesmo aglomerado que cada um de nós começou a sua existência.


Comentários
Por Albina Maia (Professora), em 2013/02/06
Esta é uma questão sempre atual e bastante controversa.Fico agradavelmente surpreendida por ver os nossos jovens assumirem as suas opiniões sobre temas como este. Parabéns.

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