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Sejam 8 ou 80.
Por Yasmin Briggs (Aluna, 4º ano), em 2019/04/09970 leram | 0 comentários | 104 gostam
Artigo de opinião da estudante Yasmin Briggs (4Asegmint), que correlaciona a crônica "Mineirinho", de Clarice Lispector, com o episódio do fuzilamento na Zona Oeste do RJ.
O octogésimo tiro me assassina — porque eu sou o outro.

     Quarenta anos anos depois, a definição de Clarice Lispector ainda nos é oportuna: essencialmente sonsos. Foi assim que a autora da crônica “Mineirinho” definiu a sociedade, que se mantinha adormecida sobre a amplamente noticiada morte de José Miranda Rosa, um dos bandidos mais procurados pela polícia do Rio de Janeiro na década de 1960, com treze tiros.
     Clarice enfrenta, então, um dilema: por que era de maior importância contar os treze tiros que mataram Mineirinho que pontuar seus crimes? E conclui: de uma vida inteira, o que se salva às vezes é apenas o erro. Mineirinho, era, para ela, o espelho de si e de suas ações, a revolta e o amor que não sofreram a justiça prepotente simplesmente por estarem adormecidos na comodidade. É a partir desta comodidade então que nasce a justiça fantasiada de vingança, esta que nos primeiros tiros nos alivia por não exercermos papéis de conflito, mas que a partir do segundo, e até o décimo terceiro, traz a tona nossas culpas.
     Esta justiça, que há quarenta anos matara Mineirinho à queima roupa, é a mesma que no último domingo alvejou um carro com oitenta tiros, na cidade purgatório da beleza e do caos, onde estava Evaldo dos Santos Rosa e sua família, sendo ele a única vítima fatal do ocorrido. Hoje, não há mais motivos para acreditar que essa justiça esteja apenas “fantasiada”, afinal, ela por si só assume o papel do executor, escolhendo suas vítimas a dedo por sua cor e classe, e sujando suas mãos com sangue de quem eles julgam estarem fadados a viver pobres, presos ou mortos. E assim seguem os dias na cidade onde inomináveis governantes dão aval e insistem em parabenizar aqueles que matam, quando seu dever, acima de tudo, é de proteger.
     Em tempo, parafraseando Clarice, sigamos acreditando que por mais perigoso que seja compreender o outro, qualquer que seja o crime dele, adormecido ou gritante, nosso objetivo é uma justiça que olha para si e enxerga a todos nós, e não encara suas ações como engano, vingança ou cortesia; cantava Elis Regina, “onze tiros e não sei porque tantos, esses tempos não tão pra ninharia, não fosse a vez desse um outro ia”.


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