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Jornal do Médio Vale do Paranapanema
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NAS SERRAS DA CHELA RESPIRA-SE SAUDADE
Por Eleutério Gouveia Sousa (Leitor do Jornal), em 2019/08/16245 leram | 0 comentários | 44 gostam
hISTÓRIA DE EMIGRANTES MADEIRENSES

Octaviano Correia
COMO SE ENTRE O MAR E A SERRA NÃO HOUVESSE DISTÂNCIA
Crónicas | 16/08/2019 09:00
Em 1884 um grupo de homens e mulheres, vindos da distante ilha da Madeira, desembarcam do vapor Índia, em Moçâmedes.
Moçâmedes, um lugar que já foi "Chitoto Chobatua" - Buraco dos Passarinhos - nome dado pelo povo mucubal a uma aldeia de pescadores, pastores e caçadores que existia na baía do Namibe, no século XV..Que, em 10 de Julho de 1645, Francisco de Souto-Maior, administrador colonial português que exerceu o cargo de Capitão-General na Capitania-Geral do Reino de Angola desde Outubro de 1645 até 1646, passou a chamar-se de "Angra dos Negros" - ou Enseada dos Negros - nome dado em virtude do embarque de escravos feito naquela baía. Em 1785, finalmente, durante uma expedição de supervisão da condição da povoação de Angra dos Negros, foi batizada pelo tenente-coronel Eusébio Pinheiro Furtado de "Baía de Mossâmedes" em homenagem a José de Almeida e Vasconcelos, Barão de Mossâmedes.
Mas do que, neste escrito vos vou falar, não é exactamente de Moçâmedes, mas das terras altas e verdejantes da Huíla que se recortam, altaneiras, em escarpas abruptas sobre o deserto do Namibe.
Depois de longa e penosa travessia das areias escaldantes do deserto do Namibe os homens e mulheres desembarcados do vapor Índia, chegam ao que hoje se chama boca da Humpata, a quase dois mil metros de altitude e deixa-se extasiar pelo verde luxuriante de um vale estendido, qual lençol esmeralda, lá em baixo, recortado por três ribeiras que, àquela distância, brilhavam silenciosas descendo da vertente das escarpas que acabavam de vencer.
Logo à primeira vista se confirma o seu clima ameno, o perfume vagueando no ar, a espetacular paisagem da verdejante serra circundante,¬ atributos que prenderam de imediato a colonização à terra. Aquela serra, totalmente arborizada, verde, de águas cantantes, fazia lembrar a sua Ilha da Madeira. E ficaram. E construíram. Ergueram casas e rasgaram ruas. E fizeram filhos. E deixaram netos.
Hoje, o Lubango, os colonos madeirenses nunca a trataram por Sá da Bandeira, é uma cidade de gente trabalhadora. Simples. Acolhedora. Simpática. De olhos e braços quase na totalidade voltados para a agricultura.
Lubango. Nome que vem da redução do nome do soba dos muílas que tinha o nome de Calubango - ou Kaluvango - que recebeu a primeira expedição europeia nas suas terras passando, a área sob o seu domínio, a denominar-se Terras do Calubango e, com o tempo, Terras de Lubango.
Hoje é Agosto. O Lubango está em festa. Festa que os homens e mulheres da Madeira trouxeram na bagagem. Na bagagem repleta de saudades. Lembranças. Recordações. E transmitiram e cimentaram no alto da serra da Chela com a construção de uma capela. Pequenina. Muito mais pequena que a majestosa igreja que se ergue na montanha sobranceira ao Funchal, mas que alberga uma Senhora que lembra a sua. A Senhora do Monte.
E lá na Ilha distante, hoje, há festa. Também. A Festa de Nossa Senhora do Monte. A maior de todas. E, ao mesmo tempo, pelos vales da Chela, no Lubango, sobem os ecos dos cânticos. As orações. A procissão desfila em devotas promessas e os pedidos erguem-se no ar à Senhora que as saudades trouxeram do outro lado do mar.
O Lubango está em festa. É como se um pouco da alma dos que o fundaram pairasse por sobre o verde das serranias. É como se entre o mar e a serra não houvesse distância diluída num abraço de homens e mulheres que, há muito, deixaram um pouco de si numa terra de outras gentes e que, num abraço, fizeram uma nova terra que passou, também, a ser a sua.


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